segunda-feira, 3 de setembro de 2012

António Aleixo-(Poeta popular)-Este livro que vos deixo-(1899-1949)

"Após um dia tristonho ,
De mágoas e agonias
Vem outro alegre e risonho,
São assim todos os dias.


Olhas para mim e sorris
Desdenhas dos meus tormentos;
Os gestos dos imbecis
Mostram os seus sentimentos.


C'm o mundo pouco te importas
Porque julgas ver direito
Como há-de ver coisas tortas
Quem só vê em seu proveito?


Eu não tenho vistas largas,
Nem grande sabedoria,
Mas dão-me as horas amargas
Lições de filosofia.


Uma mosca sem valor
Poisa com a mesma alegria
Na careca de um doutor
Como em qualquer porcaria.


Que importa perder a vida
Em  luta contra a traição,
Se a razão, mesmo vencida
Não deixa de ser razão?


Quem me vê dirá :não presta,
Nem mesmo quando lhe fale,
Porque ninguém traz na testa
O selo de quanto vale.


Se pedir peço cantando,
Sou mais atendido assim;
Porque se pedir chorando,
Ninguém tem pena de mim.


Casado que arrasta a asa
À mulher deste e daquele,
Merece que tenha em casa
Outro homem em lugar dele.


Eu não sei porque razão
Certos homens, a meu ver,
Quanto mais pequenos são
Maiores querem parecer.


Muito contra o meu desejo,
Sem lhe q'rer dizer porquê,
Finjo sempre que não vejo
Quem finje que não me vê...


Enquanto o homem pensar
Que vale mais que outro homem,
São como os cães a ladrar
Não deixam comer, nem comem."